Segundo o levantamento da ONG Transparência Brasil, 639 municípios com obras de escolas e creches financiadas pelo governo federal que estavam paralisadas ou inacabadas receberam dinheiro do orçamento secreto.
Um relatório da ONG Transparência Brasil demonstrou de que forma o orçamento secreto contribuiu para má gestão de recursos de obras na área da Educação.
Já faz tempo que os alunos de uma escola esperam a cobertura prometida para a quadra.
“Tem sol o dia inteiro. Então realmente lá precisa, sim, de uma cobertura para as crianças poderem frequentar a quadra”, diz uma mãe.
A escola fica em Campos dos Goytacazes, no estado do Rio. É uma das dez obras com recursos da União que estavam paralisadas na cidade em dezembro do ano passado, segundo um relatório da ONG Transparência Brasil. Mesmo assim, no período de 2020 e 2021, Campos foi escolhida para receber mais R$ 3,2 milhões do orçamento secreto para 23 novas obras.
A Transparência Brasil constatou que situações como essa, de mau direcionamento dos recursos federais para estados e municípios na área da Educação, se agravaram com o orçamento secreto, criado em 2020.
Segundo o relatório, 639 municípios que já tinham obras escolares financiadas pelo governo federal, que estavam paralisadas ou inacabadas, mesmo assim, foram beneficiados pelo orçamento secreto.
O governo federal financia, por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, autarquia ligada ao Ministério da Educação, obras em escolas e creches. É o FNDE que analisa e aprova a liberação dos recursos.
Em 2019, 85% do valor empenhado – ou seja, reservado pelo fundo para obras em escolas e creches – foram decisão do Poder Executivo. Mas em 2020, essa proporção se inverteu: foram os parlamentares, por meio do orçamento secreto, que determinaram o empenho da maioria do dinheiro. Já o governo federal não participou de nenhuma decisão sobre o destino desses recursos, segundo o relatório.
“É o próprio Congresso que está decidindo quem vai receber o recurso público do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. O fundo deixa de ter o poder de decidir onde é mais prioritário investir, de fazer o controle de como o município está lidando. Isso passa direto para que o recurso seja liberado do Congresso para o Executivo”, explica a diretora-executiva da Transparência Brasil, Juliana Sakai.
Para a ONG Todos Pela Educação, a falta de transparência e de critérios técnicos traz um risco: aumentar ainda mais as desigualdades de acesso à educação.
“A questão técnica, ela precisa vir em primeiro lugar e o que a gente vê, com a prática do orçamento secreto, é exatamente o contrário. Isso é absolutamente divergente da ideia de uma educação menos desigual, que tem no governo federal um ator importante para o seu enfrentamento”, relata Olavo Nogueira Filho, diretor-executivo do Todos Pela Educação.A prefeitura de Campos dos Goytacazes afirmou que as obras foram paralisadas na gestão passada, que, assim que assumiu, a Secretaria municipal de Educação retomou as obras, agora em andamento ou em fase de licitação, e que pretende retomar os trabalhos na quadra no ano que vem.
O Jornal Nacional entrou em contato com o Ministério da Educação e com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, mas não teve resposta.
Em 2021, a maior parcela dos recursos empenhados também partiu do orçamento secreto.
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